Óbvio que comigo não é diferente. É terrível estar nessa situação.
No entanto, em uma viagem minha, ao estar em uma fila interminável, eu acabei me divertindo. Muitos fatos curiosos aconteceram. Claro, virou história para o blog!!
Confira:
Toda viagem que faço para uma cidade grande não pode faltar, no meu roteiro, uma ida para um estádio de futebol.De preferência com jogo. Visitar uma cancha quando não tem partida é igual ir para um salão de festa sem festa.
Quando estive no Rio de Janeiro o principal evento futebolístico que iria ocorrer era Botafogo x Vitória, no Nilton Santos, pelo Campeonato Brasileiro. Inicialmente a peleja estava agendada para as 11h. Depois passou para as 16h. O que é ótimo. Jogo pela manhã, aos domingos principalmente, deveria ser crime inafiançável. Exageros a parte...lógico que eu iria para o Engenhão, independente do horário. Cheguei a receber o convite de 3 pessoas (uma delas não pode ir).
Fui ao local do confronto, de carona com um amigo meu jornalista, Plínio.
Carro estacionado no setor norte do Engenhão, o periodista indicou-me onde era o setor leste para encontrar uma minha amiga (Aline) com quem também havia combinado de ir ao jogo.Naquele momento, ela, sócio-torcedora, através das redes sociais, me comunicou que já estava dentro do estádio. Plínio ficaria no setor destinado aos jornalistas.
Eu, caminhando, fui comprar o meu ingresso. Ali iniciou um calvário. Não só meu, como de muitos botafoguenses que queriam incentivar o Alvinegro no duelo contra os baianos.
Os organizadores pediram para formar uma fila.Fila formada e estava enorme!
Fila! |
Um sol de rachar e uma fila quilométrica para encarar. O relógio anotava 15h50. Faltavam dez minutos para o árbitro mandar a bola rolar.Claro que percebi que iria perder o início do duelo. Já me conformei. Estava 'preso'na fila e querendo saber em que momento eu iria adquirir o meu passaporte para adentrar em mais uma cancha na minha vida.
Mais fila! |
Não demorou para que a impaciência tomasse conta geral do público.
- Porra, 'mermão', que horas nós vamos entrar? Que merda!
O trecho acima foi repetido, com algumas mudanças no vocabulário, várias vezes.
Poucos minutos depois, aparece um torcedor que vinha do começo do 'engarrafamento', tentando convencer um por um a desistir de assistir a partida.
-Se eu fosse vocês, voltava para casa! A fila não anda. Tem bilheteria fechada e está tudo enrolado lá na frente. Eu não vou ficar aqui. Façam o mesmo!!
Poucos desistiram da batalha. A maioria ficou.
Confesso que eu fiquei na dúvida sobre qual decisão tomar. Entretanto, para voltar, ficaria difícil e caro. Também pensei que possivelmente poderia não ter a chance de retornar ao Engenhão tão cedo. Outra situação é que de fato eu nunca havia estado em uma fila tão grande para um jogo de futebol. Soube de algumas situações apenas pela TV. Por fim, a curiosidade de saber em qual momento eu conseguiria 'cruzar a fronteira' foi mais um argumento que me fez seguir plantado ali por uns bons minutos.
De repente se escuta gritos vindos dentro do Estádio. Logo todos tentam identificar. Foi gol? Gol de quem? Um pergunta para o outro. Outros consultam o celular para saber se já havia a informação. Até que foi noticiado que os soteropolitanos haviam feito 1 a 0 com David.
Tristeza no lado de fora. Eu recebia mensagem do povo de dentro me informando do tento rubro-negro. Respondia dizendo que ouvi os gritos que vinham do Nilton Santos.
Na sequência, um grupo de botafoguenses atrás de mim inicia um papo de torcedores.
- Será que vamos perder hoje? O Roger é desfalque até o fim do ano e depender do Brenner vai ficar difícil.
- Esse Brenner jogava bem no Inter. Fazia muitos gols lá.
-Mas o Inter tem o D'Alessandro na armação das jogadas. Até eu faria gol.
Alguns minutos depois, ouve-se novamente um grito vindo da cancha. Todos tentam identificar o que é.
Sim, gol de empate. Quem fez? Brenner.
- Brenner! nunca critiquei.
A frase acima foi dita pelo adepto que o difamou e que não confiava nele.
O cotejo já estava nos 25 minutos.
Na fila, algumas pessoas estavam cada vez mais impacientes. Procuravam sinal de internet para acompanhar o jogo em algum tempo real, outros tentavam sintonizar em rádios e alguns saiam da fila para procurar uma TV que transmitisse o jogo.
Quem estava adorando aquele tumulto eram os ambulantes. Aproveitavam para tentar lucrar um pouco mais.
Uma jovem passava com o seu isopor no ombro e anunciava:
-Olha a cerveja gelada! Geladinha. Alguém vai querer?
Pouco depois, ela se aproxima de mim e oferece o produto etílico e eu em tom de brincadeira, respondo:
- Eu quero ingresso. Não tem?
Ela apenas sorri.
Eu até estava com vontade de tomar cerveja. No entanto, 'breja' dá vontade de urinar e se isso acontecesse eu estaria encrencado, pois sozinho na fila perderia o meu lugar. Então, não podia usufruir desse luxo.
Enquanto isso, em mais uma roda de botafoguenses o assunto foi o vice-campeonato da Copa do Brasil do Flamengo dias antes. O goleiro Alex Muralha foi eleito o vilão do revés, pois nas cobranças de pênaltis pulou todas pelo lado direito. Além de ter sido displicente e mostrado muitas vezes para o batedor, em qual canto se jogaria. Uma estratégia de jogo como definiu o arqueiro após a derrota no Mineirão para o Cruzeiro.
- Aquele Alex Muralha é muito ruim. Que horrível. Pulou do mesmo jeito e no mesmo canto!
- Comemorei aquela derrota como um título. O Flamengo não podia ser campeão. Não merecíamos isso.
-O Flamengo é um time que tem, em toda a sua história, apenas um ídolo. Zico. Vive disso até hoje.
-Concordo, já nós temos vários e vários ídolos.
-Não só temos vários, como o maior jogador da história do futebol jogou no Botafogo. Garrincha.
- Sim. Sem dúvida (umas 4 pessoas concordaram).
- Mas o melhor do mundo não é o Pelé? (se atreveu um deles a discordar)
-Pelé, o CARALHO (a ênfase foi grande). Ele só ganhou três Copas do Mundo, porque tinha um time todo de craques. O Garrincha em 62 ganhou sozinho aquela Copa.
-Que Pelé, o que. Pelé o meu pau (isso dito por uma menina!)
Já se passava dos 30 minutos da etapa inicial quando um torcedor pegou o celular e começou a gravar um vídeo pelas redes sociais, mostrando todo o descaso. Aos gritos, ele protestava:
- Olha isso aqui! Que vergonha, hein, diretoria? O pessoal do marketing, da gestão, não podem deixar isso acontecer. O jogo em andamento e essa fila imensa. Todos aqui pelo Botafogo!!
Ele passou com o celular próximo a todos as 'vítimas', inclusive a mim e eu dei um 'tchauzinho' (se alguém achar a publicação me avisem).
Na minha frente, havia um pai com um casal de filhos. Todos fantasiados de botafoguenses. As crianças (não deviam ter mais que 12 anos) lamentando o fato do Botafogo não mandar mais os jogos na Ilha do Governador (onde a família residia e era mais perto para ir) e sim no Engenhão. Por ser mais próximo de onde viviam, conseguiam comprar os bilhetes com antecedência. Disseram que nunca tinham passado por isso antes.
O relógio mostrava que a partida estava por volta dos 40 minutos. O local onde me encontrava na fila já estava próximo da bilheteria. Por ali, um cambista passou me oferecendo ingresso (com policiais por perto).
O relógio que dizia aos torcedores quantos minutos perderam na fila. Eu entrei um pouco depois das 16h42 |
- Ô jovem, não quer um ingresso agora? Vendo por R$60,00.
Neguei, pois achei muito caro para ver apenas o segundo tempo.
-Então cobro R$50,00. O que acha?
Novamente disse que não queria. Em seguida, ele foi embora, pois o próximo valor mais baixo que ele iria fazer já era o que ia pagar para entrar.
Um dos momentos de mais alivio foi quando um segurança me chamou e falou para eu escolher uma das cabines para esperar a minha vez de adquirir o meu ticket. Sai da fila única e escolhi a cabine 10.
Depois de uns 5 minutos finalmente chegou a minha vez de comprar o ingresso!! Uma inteira.
Nem acreditei quando peguei o ingresso. Aquela mistura de felicidade com alívio foi tanta que comemorei com pessoas ao meu redor: 'CONSEGUI. CONSEGUI. VAMOS LÁ, PESSOAL!! VAMOS CONSEGUIR ENTRAR'. Todos me cumprimentavam e felicitavam-me.
Fui em direção ao setor leste superior. Coloquei meu ingresso na maquinha para validar a minha entrada. Vale ressaltar que fui revistado por uma mulher. Não me recordo disso ter acontecido outra vez na minha vida.
Em seguida olhei para a tal leste superior e vi o quanto ainda teria que subir para chegar lá. A subida era igual aqueles estacionamentos de 4 ou 5 andares de shopping. Só que subir tudo a pé. Confesso que deu um desânimo. Mas fui.
Subi, subi, subi....e cheguei!Vi o gramado vazio. O jogo ainda estava no intervalo. Agora a terceira e a última missão: achar a Aline.
Era nítido ver o quanto de pessoas ao meu redor estavam procurando seus amigos e ao olhar tanto para cima como para baixo se notavam seres no celular, tentando apontar para um e para outros onde estavam.
O que me incomodou no Engenhão é que os setores que separam umas fileiras de cadeira de outras era muito estreito. Não dava para passar.
Tentava manter contato com a minha amiga e ela tentava me dizer em que local da arquibancada ela estava. Quem disse que eu a achava? Tentava ligar e só caia a ligação.
Nesse período, foi possivelmente o único momento em que eu de fato perdi um pouco a paciência. Não acreditava que ainda tinha que passar por isso.
Enfim, tentei ligar pela terceira vez e a chamada rendeu! Era o celular numa orelha e a mão na outra. Para abafar os gritos da torcida, pois os jogadores já voltavam do vestiário.
-Olha, Léo, eu estou te vendo.Eu estou umas fileiras mais abaixo de onde você esta. Você está com uma roupa cinza e com a mão na orelha.
-Isso, mas eu não estou te vendo.
- Estou aqui (nesse meio tempo os gritos da torcida já incomodavam bastante, enquanto Aline descrevia o lugar em que estava).
- Ok, vou tentar achar.
- Aqui...vem para cá...mais para cá, você está chegando.
Nisso, saiu pênalti para o Botafogo.Gritaria geral nas arquibancadas.
No entanto, foi nessa hora que consegui avistar minha amiga. E fiz aquele pedido chato em um momento importante do jogo. Licença para chegar até o meu assento. Sorte que havia um vago perto da Aline. Ai tive que passar espremidamente por umas 5, 6 pessoas. Constrangedor. Sentei. Antes de cumprimentar minha amiga, saiu o gol de empate.
Gol é gol. Comemorei! Tinha um tiozão do meu lado que eu o abracei!!Na hora da comemoração, umas das coisas mais legais é abraçar quem você não conhece. Compartilhar uma felicidade com um desconhecido. Momentos que só um gol pode proporcionar.
Após cumprimentar minha amiga e por brevemente o papo em dia, começo a olhar o jogo (eu nem sabia direito o que estava acontecendo).
O tal do tiozão que falei acima era a grande figura da arquibancada. O 'coroa' tinha o cabelo grisalho, uma barriguinha que é normal de quem está na meia-idade, camisa simples, bermuda e chinelo. Bebia, fumava e cornetava os jogadores. Seus principais alvos eram o lateral-direito Luis Ricardo e o meio-campista Leo Valencia.
-Ei, Jair (técnico) coloca o Jéfferson (goleiro reserva) na lateral-direita! É muito melhor que esse Luis Ricardo.
- Não vai tirar esse Luis Ricardo, não? Até quando vamos aguentar ele?
De repente, o ala pega a bola e parte para o ataque. Finta um atleta do Vitória e eu escuto:
-Isso, Luis Ricardo. Tu é bom!
O lateral passa por mais um adversário e novamente escuto:
-Luis Ricardo tu é bom!! tu é bom.
Fominha, o ala tenta driblar um terceiro e perde a bola. A corneta surgiu:
-Luis Ricardo tu é bom....tu é um bom filho da puta!!!!
Risos gerais.
-É, ué. Ninguém deixa eu terminar de falar (rindo sarcasticamente)!
Enquanto o jogo seguia, o tiozão chama um menino (no máximo 10 anos) próximo a ele e pergunta:
- Qual é o seu time?
-Botafogo!
-Viram (tentando falar pras pessoas próximas a eles)! Botafoguense. Ele era flamenguista!! flamenguista!Eu o converti pro Botafogo!!
Posteriormente, o tiozão pega mais um cigarro. Eu, em tom de brincadeira, pergunto se ele estava muito nervoso com o jogo.
- O Botafogo sempre me deixa assim. Hoje já foi um maço de cigarro!
Parecia que ele ia advinhar o que ia acontecer e quem seria um dos carrascos daquela tarde.
-Olha o Léo Valencia...com esse tamanho (pequeno) querendo partir para o ataque. Assim não dá. Esse anão não vai resolver o jogo.
O chileno tem 1,68 m.
Novamente, Leo Valencia pega a bola e tenta ir para o ataque, pela linha de fundo.
- Olha ai, ele tentando de novo! Vai, vai....e não foi...perdeu a bola.
Eu quando estou viajando e vou a um jogo sempre fico torcendo para o time anfitrião. Troco de time por 90 minutos. É pela diversão. Gosto disso e nunca tive problemas.
Não recordo exatamente o que houve em uma jogada do Alvinegro e eu cornetei um atleta e disse:
- O que foi isso? Meu, não dá para fazer essa jogada!
De repente, o tiozão vira para mim e pergunta:
-Tu é 'paulixta'?
Fico surpreso e respondo que sim.
Ele ri e explica:
- Tu disse a palavra 'meu' e deu para perceber. Carioca não usa esse termo. Qual time você torce?
Respondi que para o São Paulo.
Em seguida, ele traga o cigarro, ri sarcasticamente e me fala:
- Ano que vem vai jogar a segunda divisão!!
E seguiu rindo.
Eu, no meio de uma torcida toda botafoguense, apenas fiquei com aquela cara de tacho.Não podia ter outra reação.
No final da peleja houve uma tragédia. Um final de história triste. André Lima, com um passado bem identificado com o Glorioso, empata a partida aos 44 minutos.
Dois minutos depois, Leo Valencia revida uma falta sofrida por Ramon e acaba expulso. O tiozão claro, ficou bravo, com a atitude do chileno.
Aos 49 minutos, Danilinho anota o dele, o terceiro do Vitória e o que garantiu o triunfo do Rubro-Negro.
Para tristeza geral no Engenhão. Uma tragédia. Um momento chato de presenciar em estádios é a derrota de um time mandante. Fica um clima de velório.
O tiozão se despediu de mim e foi embora.
Assim como na entrada, a saída era a mesma. Logo descer todo aquele labirinto.Já na parte de fora do estádio escutava alguns comentários.
- Não acredito que perdi um churrasco pra vir aqui e ver o Botafogo perder.
-É a segunda vez que uso essa camisa do Botafogo em dia de jogo. Dois jogos e duas derrotas. Agora vou deixá-la guardada.
-Tem coisas que só acontecem com o Botafogo.
Sim, a última frase foi dita. Eu escutei esse chavão.
Mesmo com o placar ruim para os cariocas, foi legal ver aquele 'mar de gente' vestindo as cores Branco e Preta da equipe de General Severiano. Pessoas jovens e velhas. Muito marcante em uma cidade onde a maioria é torcedora do Flamengo.
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